quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A Ditadura do Orgasmo


Na década de 60, as mulheres lutaram por liberdade sexual, por ter direito ao prazer e por se emanciparem da repressão da família e da sociedade. Parece que deu certo, e deu certo até demais.

Hoje, tanto as mulheres quanto os homens, são quase intimados a apresentar um bom desempenho na cama e a ter uma vida sexual obrigatoriamente ativa. É a revolução sexual às avessas.Não ter vida sexual ativa, e bem ativa, passou a ser sinônimo de fracasso.

Depois de dizer adeus aos preconceitos, às proibições, à repressão sexual, a sociedade parece viver numa espécie de ditadura do sexo.Um exemplo disso é a obrigatoriedade do orgasmo, principalmente no caso das mulheres. Muitas fingem que chegaram ao ápice do prazer só para não correrem o risco de perder o parceiro, de serem consideradas mutiladas sexuais.

As pessoas vivem querendo ser uma espécie de atletas na cama como, se estivessem participando de uma disputa onde o mais feliz será aquele mais permissivo, libidinoso, descontraído e sexualizado.Quando a pessoa não consegue ter o desempenho esperado, tanto homens quanto mulheres, acabam se sentindo obrigatoriamente deprimidos, infelizes e frustrados. Essa baixa auto-estima se mostra mais contundente quanto mais a pessoa se queixa publicamente desses seus "defeitos".O problema talvez seja o modelo e parâmetro culturalmente estipulado para que a pessoa se sinta feliz, independentemente dos próprios princípios, gostos, crenças e valores.

Quem não obedece o modelo divulgado por certas "novelas" deve se sentir frustrado, retrógrado e infeliz.Depois de muito tempo de repreensão da sexualidade, as pessoas, principalmente as mulheres, decidiram virar a mesa e viver o sexo com mais liberdade. O problema é que partiram do proibido diretamente para o obrigatório e o que era para ter sido uma revolução sexual, virou ditadura.Na tentativa de se adaptar a tanta modernidade, surgem os conflitos pessoais. Muitas vezes, as pessoas adotam comportamentos que vão contra o que desejam e acreditam, ou seja, acabam fazendo o que devem (culturalmente) de forma emancipada daquilo que desejam de fato. Ou acabam desejando aquilo que não devem.

O exemplo disso é que antigamente as mulheres eram coagidas a permanecerem virgens até o casamento mas hoje, a adolescente que ainda não perdeu a virgindade é questionada pelas amigas e até ridicularizada.Mas nem todas as pessoas cedem a essa pressão cultural externa. Para aqueles que aderem à obrigatoriedade da vida sexual ativa e cheia de orgasmos, porque de fato é isso que querem, não há problemas.

Aqueles que não são, em suas intimidades, sexualmente ávidos mas têm determinadas características de personalidade que as levam a ter um comportamento excessivamente preocupado com o que se espera delas, ou excessivamente preocupado com o que vão pensar delas, a possibilidade de terem conflitos é maior, inclusive disfunções sexuais.As pessoas muito preocupadas em terem desempenho sexual de acordo com os padrões vigentes, na verdade, se acostumam a atender uma cobrança não apenas externa, da cultura, mas também interna, de sua própria ansiedade em satisfazer as expectativas dos demais.

Fonte: Veja ed. 1692- 21/03/2001